Título: Ainda estou aqui
Autora: Marcelo Rubens Paiva
Editora: Cia das Letras / AlfaGuara
Skoob / Goodreads
Páginas: 296
Trinta e cinco anos depois de Feliz ano velho, a luta de uma família pela verdade Eunice Paiva é uma mulher de muitas vidas. Casada com o deputado Rubens Paiva, esteve ao seu lado quando foi cassado e exilado, em 1964. Mãe de cinco filhos, passou a criá-los sozinha quando, em 1971, o marido foi preso por agentes da ditadura, a seguir torturado e morto. Em meio à dor, ela se reinventou. Voltou a estudar, tornou-se advogada, defensora dos direitos indígenas. Nunca chorou na frente das câmeras. Ao falar de Eunice, e de sua última luta, desta vez contra o Alzheimer, Marcelo Rubens Paiva fala também da memória, da infância e do filho. E mergulha num momento negro da história recente brasileira para contar — e tentar entender — o que de fato ocorreu com Rubens Paiva, seu pai, naquele janeiro de 1971.
Ainda estou aqui, é uma das obras mais marcantes que já li do Marcelo Paiva. Lançado em 2015 pela Alfaguara, selo da CIA, o livro se faz solene por narrar a infância e juven,tude do próprio autor. Fiz algumas pesquisas, e li que há outro livro lançado por ele, intitulado "Feliz Ano velho" que irá contar o trágico acidente que aconteceu com o autor, o fazendo ficar paraplégico. Em contradição com o livro que citei, anteriormente, Ainda estou aqui é uma obra mais abrangente por não trabalhar apenas acontecimentos trágicos, mas que de certa forma as coisas ruins surgem como um pontapé inicial para mudanças marcantes em nosso país.
Um grande exemplo de luta e superação, Paiva sempre buscou enfrentar os maiores desafios. Com uma infância atordoada e desafiante, ele nos mostra que nem sempre devemos reclamar da atual realidade de nosso país. Sim, são tempos difíceis, quase ditatoriais, mas ainda sim temos o direito de ir as ruas protestar por nossos direitos, o que em sua época não era possível, pois quem tentasse ir de encontro ao governo seria exilado.
Conhecemos, então, que o pai do Marcelo foi deputado, em uma época dura e perigosa, e por "destilar o veneno" em um terreno inapropriado ele é exilado e em seguida preso pelo exército ditador. Assim como hoje, tudo que era feito por este governo era sigiloso, misterioso. Não dava para negar e nem sequer confirmar, por isso, não sabemos ao certo se o Rubens Paiva, foi torturado vivo e morto, por fazer parte da oposição que ia de encontro a tirania desse tipo de governo que assolou vida e matou inúmeros inocentes.
É triste perder um pai ou uma mãe, principalmente quando criança, que foi o caso do Marcelo. Por outro lado, a mãe do menino enfrentou os desafios que a vida lhe trouxe e se formou em direito. Eunice Paica, fez juz ao título estando a frente de inúmeras lutas, a exemplo; os direitos dos indígenas que estão sob ameaça do Regime Militar. Anos se passaram e a mãe dele enfretara uma luta consigo mesma, a batalha contra o Alzheimer (com pouco mais de setenta anos).
Na obra há descrições sobre a infância e juventude do autor. Embora conheçamos um pouco sobre a vida de seus pais, sua cidade natal e o regime militar; o protagonista evidencia não apenas a si mesmo nesta biografia, mas a nacionalidade de um povo, ora silenciado pelo tratamento do exercito e pela tirania do governo.
"A maioria não tinha ideia do que se passava. A censura e o milagre brasileira cegavam"
Em se tratando de biografia, o livro é narrado em primeira pessoa, o que não é de certa forma ruim, pois o narrador personagem não evidencia suas emoções, a imparcialidade se faz presente por quase toda a obra. Somado a isso, a escrita do autor é madura, quase não percebemos que ele fala de si mesmo e que tudo aquilo que aconteceu foi com ele. Seria ilógico não citar que há momentos que o Marcelo tece criticas sobre o Regime Militar, que apenas um leitor atento consegue fisgar.
É quase impossível não se emocionar com essa história de vida tão trágica, desde a infância até os dias atuais ele se demonstra um vencedor e não existe nada maior para ele do que lutar pela sua vida e pela vida do seu povo.
A sinceridade eclodida pelo autor nos toca, nos emociona a tal ponto que percebemos como somos mesquinhos quando reclamos de uma comida, dos relacionamentos, da vida... Ele nos comprova que as pessoas que torturam pode ser qualquer um de nós, se fazer presente nas profissões que menos percebemos.
Nesse livro o autor agrega vestígios da obra "Feliz ano velho", confesso que fiquei perdida em determinados momentos e ao mesmo tempo me senti convidada a ler mais uma de suas obras. A grande dificuldade na leitura do livro esteve na organização dos fatos e das memórias de vida do Marcelo. Ele mesmo, por vezes, era confuso ao descrever determinado acontecimento, o que dificultou a leitura de alguns capítulos.
"[...] - Eu não concordo com isso. Isso vai acabar. Um dia, vai acabar. O que estão fazendo aqui não está certo. E quando acabar, e nos reencontrarmos um dia, em outras condições, espero que a senhora conte a todos que eu não concordava, que só cumpria ordens e que torcia para isso acabar logo."
A capa proposta pela Alfaguara, bem como a sua diagramação atravessam a linha tênue do texto ora informativo, ora descritivo como também biográfico que traz consigo amostras e rastros históricos do Regime Militar. Fiquei admirada e me torne uma contempladora de todos estes fatos históricos. Por essa e outras várias razões discorridas aqui, que recomendo a obra para os apreciadores de leituras biográficas com um conteúdo histórico.
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