Resenha - Uma vida no escuro

25 abril 2016




Com uma carreira consolidada e um apartamento recém-comprado em Londres, parecia que a única preocupação de Anna Lyndsey seria a manutenção de seu padrão de vida. No entanto, o que começou como um desconforto diante da tela do computador revelou-se uma grave sensibilidade a qualquer fonte de luz. Em pouco tempo, trabalhar tornou-se inviável, e mesmo atividades corriqueiras passaram a causar dores lancinantes. Conforme os sintomas foram se agravando, ela precisou abrir mão da casa, da independência e de qualquer possibilidade de planos futuros.
Diante do relato de Anna sobre seus dias na escuridão, é impossível para o leitor não se perguntar o que de fato é fundamental. Se quase todas as opções fossem retiradas, das mais corriqueiras às mais preciosas, o que faria a vida continuar valendo a pena? Em uma situação em que as luzes e telas que deveriam significar segurança e comodidade são um perigo iminente, não seria de se admirar que Anna entrasse em depressão ou até mesmo cometesse suicídio.
No entanto, ela nos revela uma existência com mais nuances do que se poderia esperar de alguém mergulhado no mais profundo breu. Entre audiolivros, jogos de palavras e formas inusitadas de banir os raios de luz, Anna descobre meios de afastar os pensamentos deprimentes e perseverar mesmo com a incerteza de sua condição. Com seu contato com o mundo externo restrito à família, ao marido e às raras visitas, ela aprende a valorizar cada segundo de remissão da sua sensibilidade, admirando a natureza, a rotina e até as tarefas domésticas de uma perspectiva completamente nova.

Livro:
Uma vida no Escuro
248 páginas || Skoob || Editora: Intrínseca || Onde comprar







"Por fim, considero que terminei. Abaixo a persiana sobre a colcha de retalhos doida que fiz com papel-alumínio, fecho as cortinas e ponho uma toalha enrolada na fresta inferior da porta. Sento-me na cama cuidadosamente e espero meus olhos se adaptarem.E consigo. Finalmente consigo. Está escuro."

Ana Lyndsey era uma jovem funcionária pública cheia de sonhos e planos que vivia sua vida como todas as pessoas comuns e que lutava para conquistar seu lugar no mundo. Até o dia em que a possibilidade de estar no mundo com as pessoas lhes foi tirada. Anna aos poucos enquanto usava o computador começou a sentir um ardor no rosto que logo passava a queimar com muita intensidade. A princípio usando um ventilador para aliviar o que sentia, Anna logo descobre que aquilo já não é mais suficiente, e conforme o tempo passa ela também descobre que o resto do seu corpo começa a queimar, e também que a reação passa a acontecer não só a partir da luz do computador, mas também a partir de qualquer outra luminosidade, por menor que fosse.

"O meu amor me salvou. Esse amor me envolve com braços fortes quando choro de desespero, me proporciona uma ideia de rotina semanal, empresta alguma estrutura aos meus dias sem forma. Traz um riso diário, uma razão para continuar resistindo...... e me destrói com a culpa. Pois estou criando duas vidas na sombra, mas apenas uma precisa estar ali. Estou sugando a luz da vida de Pete, transformando-o numa criatura da penumbra, do limiar. Um sujeito solteiro, mas que não é solteiro. Alguém que, em eventos sociais, senta-se sozinho entre os casais, tendo ao lado uma estranha presença ausente."

Sem compreender o que está acontecendo consigo, Anna pede uma licença do trabalho para poder se tratar, mas aos poucos percebe que sua condição não é tão passageira. Até o dia em que precisa deixar sua casa e ir morar com Pet, seu namorado. Em meio a um apoio incondicional, Anna chega ao ponto em que precisa manter-se o dia todo trancada em um quarto escuro, hermeticamente fechado, sem que entre qualquer réstia de luz, e ainda utilizando camadas e camadas de roupas, pois somente o escuro do quarto não é suficiente.

"No escuro, os únicos materiais disponíveis são a voz, a mente e a memória, junto com a imaginação, que, a depender de como a pessoa se sente, pode ser vigorosa ou vacilante. É por isso que os jogos no escuro usam palavras. E as palavras são pequenas centelhas na escuridão, porque fazem algo se acender na consciência, como numa tela de computador. Cada uma é um pequeno estímulo, uma alfinetada mental, uma daquelas descargas elétricas que nos mantêm vivos."

Em uma narração fluida e por vezes angustiante, acompanhamos o diagnóstico da doença de  Anna, dermatite seborreica fotossensível, e o modo como ela lida com isso. Suas crises de depressão, seus jogos mentais criados para sobreviver no escuro, suas leituras de audiolivros por dias seguidos e suas pequenas lutas e progressos e logo depois a chegada dos regressos. Esse é um livro de memórias de uma pessoa que convive com uma condição extremamente difícil, mas que a sua maneira supera tudo a cada dia e faz o melhor que pode para se manter bem e para aproveitar o possível do que o mundo tem a lhe oferecer.

"Perco estações inteiras, e às vezes mais que só estações. Num ano, deixo o mundo em março, os ventos gelados açoitando os narcisos, e volto no calor abafado de junho. No ano seguinte, rego o jardim num anoitecer de maio, inspirando o perfume doce dos lilases e o cheiro ácido e penetrante do espinheiro, sentindo em tudo a expectativa vibrante do verão. Não volto a sair de casa até a época em que as folhas mudam de cor e toda a exuberância apodrece no monte de compostagem ou pende flácida dos caules murchos. É como se eu abrisse uma porta secreta no tempo, entrasse num corredor lateral escurecido e não conseguisse encontrar a saída. Vou tateando o caminho, sem saber a distância que devo andar, até que de repente minha mão encontra uma maçaneta na parede, abre-se uma porta e estou outra vez na rota principal, mas muito mais adiante."


[- Minhas Impressões -]

Esse é um livro que me interessou assim que vi o lançamento. A princípio com o título de Uma vida no escuro, que aliás é muito adequado para a história que temos aqui, eu imaginava que se trataria de um livro sobre alguém que possuía algum problema visual e fiquei intrigada, pois sou cega total e sempre gosto de conferir como os problemas de visão são tratados na literatura. Mas a minha surpresa foi grande quando comecei a ler e percebi que Anna tinha um problema muito mais sério do que isso, pois ela possui um problema na pele, que ao contato com qualquer luz, a faz sentir agonia, dores e sensação de queimadura em sua pele por dias e noites torturantes, e o principal, que essa é uma condição bastante rara que não possui tratamentos eficazes, apenas experimentos que por várias vezes Anna tentou, obtendo resultados positivos e negativos. Ainda me surpreendeu o fato de Anna ter muitas dificuldades para ter acesso a consultas médicas. Quando dizia não poder sair de casa, obviamente por causa da luz, os médicos apenas lhe diziam que teria de esperar ficar melhor para poder ir a seus consultórios, sendo que para ficar melhor ela precisaria de ajuda médica. É uma condição a qual aparentemente os médicos não estão preparados para lidar e o livro de Anna retrata um pouco de falta de assistência nesse sentido.

A narração dos momentos não é cronológica. Por vezes Anna conta a respeito de sua condição atual, ou do dia em que conseguiu melhorar um pouco e sair na rua, logo em seguida ela retrocede, nos contando como foi o gradativo desenvolvimento de sua condição, porém mesmo com esses pequenos capítulos nomeados como: vida doméstica, sonho 1, jogos para o escuro, eclipse, ponto de fuga, dentre muitos outros títulos, ela consegue nos situar dentro de sua vida e nos deixa emocionados com seus pequenos momentos de vitória e sua força em não se deixar abalar e não deixar que a depressão tome conta de si.

Anna é uma mulher forte, que sempre faz o possível com aquilo que tem. Seu marido, Pet, também é um grande companheiro e é perceptível o amor sincero dos dois. A mãe de Anna e o irmão também são pessoas importantes em sua vida, dando-lhe apoio sempre que possível, assim como seus "Amigos de telefone", que no geral são pessoas que possuem alguns problemas que os isola assim como Anna, e com eles ela pode se sentir a vontade e ser compreendida em sua solidão.

O livro é dividido em capítulos curtos e é de uma leitura muito rápida, não nos permitindo largá-lo até a última página, ansiosos para sabermos o que acontece no próximo capítulo e o que a autora tem a nos ensinar. A  revisão da editora Intrínseca está impecável e cabe destacar que o nome Anna Lyndsey é um pseudônimo, e me senti muito curiosa para saber a respeito de qual seria o verdadeiro nome da autora e como ela vive atualmente.

Recomendo veementemente esse livro. É mais que uma biografia, é uma história de aprendizado, um livro que nos leva a pensar em tudo o que é importante na vida e como em um piscar de olhos podemos perder tudo. É um exemplo e algo quase inimaginável, são memórias que deveriam ser conhecidas por todas as pessoas.

21 comentários

  1. Oi Tamara, tudo bem?
    Eu estou bem curiosa para ler esse livro, e essa é a primeira resenha que leio sobre isso. Não gosto muito de ler biografias, mas essa parece explorar bem o lado das complicações, e ainda apresenta as demais sensações nesse percurso. Imagino mesmo que devem haver vários aprendizados nessas páginas, o que torna tudo bem mais interessante.
    Beijos, Fer

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  2. Olá Tamara,
    A narrativa desse livro parece ser surpreendente. Assim como você eu também acreditava que o livro abordava o tema da cegueira, mas me surpreendi com essa abordagem sobre fotossensibilidade, em ambos os casos o processo de adaptação é bem complicado e é preciso ter muita força para superar todos os obstáculos. Já coloquei esse livro na minha lista de leitura, espero ler em breve. Gostei bastante da sua resenha. Abraços.

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  3. Oii Tamara!! Tudo bem?
    Adorei demais sua resenha! Também fiquei interessadíssima nesse livro assim que li a sinopse, e agora que li sua resenha fiquei ainda mais empolgada com a leitura! Quero muito conhecer a história da Anna e aprender com ela e com tudo o que ela passou e superou. Espero realmente ter a oportunidade de ler logo!
    Beijos!!!
    Gaby
    http://umaleitoravoraz.blogspot.com/

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  4. Oi Tamara, eu ainda não conhecia o livro e fiquei bem impressionada com a história da Lindsay. Não me imagino na situação e realmente fiquei curiosa para ler o livro. Fiquei comovida com o quotes que você compartilhou e quero ler o mais rápido possível!!!
    observação: Cliquei no link "onde comprar" mas não está funcionando.
    MEU AMOR PELOS LIVROS
    Beijos

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  5. Oi Tamara,

    Esse livro tem uma capa e um título bem interessante, né?
    Eu adorei a premissa também, porque assim como você, tenho curiosidade as vezes de saber como algumas coisas e fatores são retratados e livros que falam sobre doenças e/ou condições são sempre uma forma de aprendizado. Além do mais, fico feliz em não ser uma narrativa linear, gosto desse jeito de contar a história. Adorei a sua resenha! Com certeza uma dica anotada. :D

    beijo!

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  6. Ola Tamara quando li a premissa do livro já imaginei o desespero da protagonista, pois é uma doença que de certa maneira a isola, e lidar com todas essas mudanças não deve ter sito fácil, gostei muito de suas impressões a resenha está ótima. Não conhecia o livro e já anotei a dica. beijos

    Joyce
    www.livrosencantos.com

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  7. Olá Tamara,
    Que premissa chocante. Sinceramente, tentei me colocar no lugar da Anna e acho que, provavelmente, nessa situação, eu me mataria. Não consigo me imaginar sem luz, a nossa vida é composta por luz!
    Fiquei muito interessada no livro porque acho que ele me trará sensações que nunca experimentei.
    A sua resenha está incrível e me deixou boquiaberta em vários momentos.
    Adorei ♥
    Beijos!
    Um Oceano de Histórias

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  8. Oi Tamara *--*

    Pra ser bem sincera contigo não sou fã de livros de memorias, acho interessante mas não é meu genero favorito. Vendo o titulo e a capa pensei que fosse alguém deficiente visual achei surpreendente ser uma doença tão grave que lhe causava até dores.

    Bjos
    http://rillismo.blogspot.com.br/

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  9. Oi
    Gostei muito da sua resenha. Também me interessei desde o lançamento, mas confesso que fiquei esperando ler alguma opinião sobre ele antes.
    Adorei suas impressões. Percebi que não é um leitura para todos, pois é densa e uma biografia interessante.
    Com certeza irei amar
    Beijinhos
    Rizia - Livroterapias

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  10. Oi Tamara, ainda não conhecia esse livro, mas o enredo dele junto com sua resenha bem elaborara me deixaram bem curiosa. Adoro as capas da intriseca que já me chamam a atenção logo de cara. Esse livro já esta adicionado na minha lista de desejados. Obrigada pela dica!
    bj

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  11. Olá Tamara!

    Eu não imaginava que esse era o tema desse livro. Vi por cima, não procurei saber mais. Uma pena pra mim, pois o livro me parece ser exatamente como gosto, despertando sentimentos e empatia. Gostei da sua resenha bem colocada, e em alguma oportunidade também pretendo ler!

    Bjus
    Blog Fundo Falso

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  12. Oiii!

    Eu não conhecia esse livro e nem sabia muito do enredo, mas eu gostei! Saber que é mais do que uma simples história é sensacional.
    Estou cansada já da mesmice sabe? É bom ler algo que nos tire da caixinha. Adorei sua resenha, falou bem e detalhadamente da obra. Isso me deixou com mais vontade de ler.

    Beijinhos

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  13. Oi, Tamara! Tudo bem?
    Ainda não conhecia este livro, mas sua resenha conseguiu prender minha atenção e despertar minha curiosidade sobre a história. Adoro histórias que têm um fundo biográfico, e como não conhecia ainda a existência dessa doença, fiquei ainda mais interessada em saber a respeito, pois deve ser mesmo algo terrível. Também fiquei aqui me perguntando como será que esta escritora conseguiu escrever o livro nas condições que a obrigavam a ficar longe da claridade. Deve ter sido um grande desafio, por isso ainda pretendo lê-lo para descobrir mais sobre isso. Obrigada pela ótima resenha. Beijos! ^-^

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  14. Oi Tamara, uau depois dessa resenha é difícil deixar o livro passar despercebido. Eu particularmente adoro biografias e ainda mais quando são histórias emocionantes, que no faz refletir sobre a vida; Eu confesso que me interessei muito nesse livro e com toda certeza já quero ele!

    Beijos

    http://www.oteoremadaleitura.com/

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  15. Oi Tamara!
    Eu já tinha ouvido falar desse livro, mas ainda não tive oportunidade de ler... Sua resenha me deixou ainda mais curiosa sobre a leitura, eu não imaginava que a vida da protagonista fosse tão difícil assim, mas só consigo pensar que eu não teria força suficiente para enfrentar uma vida como a dela. Com certeza é um livro para se refletir bastante.
    Beijos!

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  16. Oie! Eu conheço o livro pela capa e sempre achei linda. Admiro o título, porém nunca parei para pesquisar sobre o que se tratava e nunca imaginaria que a obra abriga uma história real dessa magnificência. Geralmente mantenho certa distância de biografias, porque as experiências que tive com o gênero não foram muito agradáveis, no entanto esse livro parece possuir diversos pontos que fazem o enredo especial. Não conhecia a doença abordada no livro e imagino o sufoco passado por ela tendo que se esconder da vida ao ar livre. Em situações assim, é ótimo ver a importância do apoio de amigos e familiares. Também adoraria saber como Anna está nos dias atuais. Adorei a resenha e já coloquei o livro na minha lista de desejados. *-*

    Beijos,
    Fernanda Goulart.

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  17. Eu ainda não tinha lido nenhuma resenha sobre o livro, e posso dizer que fiquei muito impactada. Que história, hein! Nem sabia que existia uma doença como essas, e nem consigo imaginar o que faria para me adaptar caso acontecesse comigo. fiquei muito interessada por este livro, creio que a história deve ser comovente.

    Tatiana

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  18. Nem sabia do lançamento desse livro, com esse título também imaginei se tratar sobre a cegueira, mas ao saber de que era uma doença deu uma perspectiva diferente, pois depois da resenha fiquei com a sensação de ser um "sick-lit" biográfico, que não são todos os livros de um dos gêneros que são de leitura positiva, mas com certeza é uma dica anotada!

    http://deiumjeito.blogspot.com.br/

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  19. Olá!

    Achei bem legal essa biografia, Leria com certeza! Pois fiquei muito curiosa para conhecer mais sobre o universo de quem possui essa rara doença que limita muito a vida das pessoas. Sua resenha fez com que eu ficasse bastante interessada em conhecer mais sobre.

    Beijinhos!
    Cantinho Cult

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  20. Olá Tamara!
    Esse livro está na minha lista de desejados e o título me deixou bem curiosa, também não imaginava que era uma história tão diferente com uma doença rara. Imagino todo o drama e problemas que a Anna passou, mas mesmo assim continuou de pé. Quero muito conferir essa história, e espero ler em breve!

    Beijos!
    http://lovesbooksandcupcakes.blogspot.com.br//

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  21. Ooi
    Sempre via esse livro mas nem mesmo sabia sobre o que se tratava. Parece otimooo, amo histórias que nos comovem! Entrou pra minha lista de desejos.
    O título e a capa são lindos!❤
    Ótima resenha!
    Beijoos!
    www.estantemineira.blogspot.com

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